Qual o peso de um corpo perfeito na sua vida? Para muitas mulheres, isso custa a própria saúde. Um triste exemplo é a morte de Liliane Amorim, influenciadora digital de 26 anos, ocorrida em janeiro de 2021. A jovem morreu devido às complicações de uma cirurgia de lipoaspiração. Mas esse texto não é apenas sobre a Liliane; é também sobre padrões e dores causadas a tantas mulheres por uma sociedade que propaga o conceito de “corpo perfeito”.
Se você é uma mulher de quase trinta anos como eu, é certeza: você já achou alguma estria, celulite ou curvas pelo corpo em uma das suas visitas ao espelho. E isso é normal e não tem nada de feio – ainda que, diariamente, você ouça que não é normal e que é feio sim. Esse é seu corpo, suas marcas e suas histórias. Mas então, por que somos ensinadas a todo momento, desde a infância, a odiar nosso corpo? Por que vivemos em constante insatisfação com ele?
Uma pesquisa internacional da Pretty Foundation mostra que 38% das meninas de 4 anos estão insatisfeitas com seus corpos e 34% das crianças com 5 anos pretendem fazer dietas. E não para por aí! No Brasil, um estudo realizado pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul com crianças de 8 a 10 anos aponta que 82% das crianças ouvidas desejavam uma silhueta diferente da sua. Entre os principais fatores associados a essa insatisfação estão baixa autoestima e percepção da criança de que havia a expectativa por parte dos pais e dos amigos para que ela fosse mais magra. A Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica (SBCP) aponta que nos últimos dez anos houve um aumento de 141% nos procedimentos estéticos realizados em jovens de 13 a 18 anos. Além disso, devido à essa alta busca por uma “estética perfeita”, o Brasil também é o quarto maior mercado de produtos de beleza.
Em 2020, a Organização Mundial da Saúde (OMS) chamou a atenção para o fato de que 10% dos jovens brasileiros sofriam com algum distúrbio alimentar. Muitos desses distúrbios ocorrem justamente pela insegurança e a busca por um padrão de beleza que na maioria das vezes é inalcançável. Começamos desde cedo a ver crianças magras e com padrões corporais europeus protagonizando novelas infantis, enquanto meninas gordas são tratadas como tristes e rejeitadas entre os colegas de escola. Meninas que só se tornam pessoas felizes quando passam por dietas e uma transformação corporal drástica. É a partir daí, no período da vida em que formamos toda a nossa base de valores e entendimento do mundo, que recebemos imagens e conceitos que nos fazem acreditar que existe um corpo ideal. Um perfil aceito por todos, onde devemos nos encaixar para sermos aceitas na sociedade.
A jornalista Agnes Arruda desenvolveu a pesquisa “O peso e a mídia: uma autoetnografia da gordofobia sob o olhar da complexidade”, a primeira tese da área da Comunicação no Brasil que aborda o tema gordofobia por esse viés. Através desse estudo, a pesquisadora aponta como a reprodução de produtos midiáticos baseados em padrões de beleza servem de exemplo para as futuras gerações gordofóbicas. Enquanto um mercado midiático e de produção de cosméticos cresce de forma disparada, lucrando com toda uma construção corporal baseada em um padrão que é sempre inalcançável, adquirimos uma visão deturbada sobre nossos corpos desde cedo. Somos ensinadas a nos odiar, a achar que sempre estamos precisando melhorar algo, esconder falhas, emagrecer mais e buscar uma beleza que muda diariamente conforme os lucros da indústria da moda e estética. Somos ensinadas a odiar o espelho e brigar com nosso próprio “eu”, adoecendo por não nos se encaixarmos em tantos moldes. Quantas de nós precisarão morrer até que os padrões sejam jogados por terra? Precisamos quebrar o preconceito ao redor do corpo gordo e entender que padrões discriminam, violentam e adoecem.

Leiliane Germano é jornalista, social media, fundadora do projeto Papo de Minas, feminista, ecossocialista, pesquisadora do tema “Cultura do Estupro” e integrante do Movimento Olga Benário e do Fórum 8M Juiz de Fora.
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Adorei o texto, Leiliane! 👏🏼👏🏼👏🏼👏🏼👏🏼 Realmente, somos massacradas pela indústria da “moda”, por conceitos surreais que não se encaixam em todos os corpos, quando sabemos que o importante é a saúde. Na época da minha adolescência, lembro de ver desfiles de moda na televisão e ficar abismada ao ver modelos esqueléticas serem aclamadas… Esqueléticas, pálidas, brancas! E desde criança eu já me espantava com as campanhas publicitárias que vendiam carros – as primeiras campanhas que atrelavam o comércio à exploração do corpo feminino. Muito há que se batalhar para quebrar tais padrões irreais. A beleza está em se sentir plena, saudável, feliz consigo mesma. Empoderada.